• 27 de maio de 2016

    Destino e limites

    – Mas sabe Akim, o problema é que eu não gosto muito disso.

    – Eu sei que não, posso dizer que não é só gosto, você teme isso também.

    – É verdade. Então…

    – Então?

    – Porque eu deveria fazer?

    – Não deve, pode escolher, se quiser.

    – Porque deveria escolher?

    – Porque?

    – Porque sim?

    – Ora, porque não?

    – Não sei…

    – O que, de fato, te traz este dilema?

    – É que… para eu me sentir mais forte eu acho que eu tenho que fazer isso…

    – Exato

    – Mas eu não gosto.

    – E quem disse que precisa gostar?

     

    Para onde vou? O que faço de minha vida? Como expressar o que sou? Essas perguntas podem causar a mais profunda alegria ou o medo mais profundo. A sensação de “estar perdido”, não saber seu destino ou de não reconhecer limites são comuns hoje em dia, como podemos lidar com este problema?

    No mundo de hoje não faltam fórmulas e dicas para alcançar a felicidade. As propagandas dos mais variados produtos giram em torno da felicidade completa do consumidor. Não há limites para o quanto se pode ser feliz, você sempre pode um pouco mais (desde que compre o nosso produto, curso, serviço).

    A enorme pluralidade de caminhos, ao invés de ajudar, atrapalha. Esta pluralidade junto com as promessas que trazem fazem com que as pessoas sintam que estão sempre perdendo. Se fez o cruzeiro, perdeu a trilha, se comprou o carro, perdeu a moto, se comprou o apartamento, perdeu a aposentadoria. O excesso de opções gera, na verdade, medo, cada vez maior, da perda e de estar fazendo a “escolha errada”.

    O problema é que as pessoas buscam as respostas nas promessas das propagandas e na lógica que estas usam. A lógica empregada nas vendas possui uma finalidade: vender. Ela não se importa, de fato, se você será feliz ou não. No entanto, as pessoas se deixam guiar – literalmente – pelas ideias de que 0 consumo pode resolver problemas relativos à emoções, problemas pessoais e ao destino que damos à nossa vida.

    Este engano gera consequências penosas. A principal delas é a desconexão com o que realmente é importante para você. Quando digo importante quero dizer o que, de fato, alimenta a tua alma. Paulo Coelho certa vez escreveu que, para ele, as coisas mais importantes são de graça: respirar, falar com um amigo, ver o por do sol. É interessante porque no meu trabalho como psicólogo, vejo as pessoas chegarem em conclusões muito próximas: são as experiências o que contam, não as coisas de fato.

    Quanto mais você se conecta com aquilo que lhe faz bem, melhor administrador de si se torna. Porém, aqui entramos em outro problema contemporâneo. “Aquilo que lhe faz bem”, é algo muito mais amplo do que o “prazer” que é o discurso vigente hoje em dia. “Eu gosto” tem um tom que é praticamente uma sentença de morte. É como se a pessoa dissesse “eu gosto” e a discussão tivesse que terminar, como se o prazer fosse um argumento contra o qual não se pode lutar.

    Não apenas se pode como se deve. O problema do prazer como a “grande meta” da vida é que inúmeros elementos que criam a auto estima e a felicidade não se baseiam no prazer. Alguns deles, inclusive, se baseiam em uma certa medida de dor e de desconforto, insegurança e até mesmo medo. “Aquilo que lhe faz bem” inclui aquilo que não gostamos e compreender é fundamental para a maturidade.

    Lida-se, então, com dois problemas fundamentais: o primeiro a concepção de que a vida é limitada, ou seja, não é possível escolher tudo. Escolher não é sinônimo de errar e se você não conseguir comprar tudo ou ler tudo é porque você é simplesmente humano. Você não precisa de todas as escolhas para ser feliz. O segundo ponto é que perceber qual a melhor escolha tem a ver com perceber o que é bom para você e isso inclui aquilo que você não gosta de fazer porque isso pode gerar benefícios.

    Estes benefícios é que são aquilo que é realmente importante. Não se trata de tirar vantagem, mas de perceber aquilo que é importante para o seu crescimento pessoal. Aquilo que nos faz crescer é o ponto onde deve-se chegar, é para onde o destino das pessoas vai. Por este motivo é que nem sempre o que “gostamos” é o que nos faz bem, o prazeroso nem sempre é o edificante.

     

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