• 29 de agosto de 2016

    Filho grande, filho pequeno

    – Mas e meu pai?

    – O que tem ele?

    – Ele não vai gostar disso.

    – Não, não vai.

    – Então?

     

    – Não vou estar desrespeitando ele?

    – Não sei, vai? É algo que você vai fazer contra ele?

    – Não.

    – Então? Há falta de respeito ou apenas divergência de opiniões?

    – Hum…

     

    O respeito pelos pais é importante, mas quando é que respeito se torna dependência? Quando a relação de proximidade se mostra, na verdade, uma relação que impede o crescimento?

    Quem lhe diz como é ser filho? Se seus pais ainda são os responsáveis pelo que é ser filho, você é o que chamo de “filho pequeno”. Há um momento em que todos nós somos filhos pequenos, ou seja, estamos aprendendo a ser gente e a ser filho. São nossos pais quem nos instruem a respeito disso, eles nos ensinam o que é ser um bom filho e como agir para ser uma boa pessoa.

    Com o passar do tempo, espera-se que a pessoa aprenda a desenvolver percepções próprias, alheias a vontade dos pais. Quando uma pessoa consegue pensar por si só, agir e assumir as consequências de suas ações dizemos que ela está se tornando adulta. Este é o desenvolvimento esperado para o ser humano: sair de uma condição de absoluta dependência para uma de interdependência com outros seres humanos e de responsabilidade pela sua sobrevivência.

    Isso vale, também, para os papéis que a pessoa desempenha. O papel de filho é um deles, muitas pessoas são percebidas como adultos, mas quando chegam na casa dos pais, voltam a ser crianças. Tornar-se um “filho grande”, significa assumir uma visão pessoal do que é ser um bom filho ou não. Não é mais o pai quem diz o que é ser um bom filho, mas o próprio filho. Assumir a sua própria noção daquilo que é ser um filho é preparar-se para se tornar pai ou mãe.

    O “filho pequeno” é aquele adulto cuja atitude frente aos pais ainda está subordinada aos pais. O filho grande é aquele que se apoderou de sua atitude frente aos pais. Muitas relações com pais são nocivas no sentido de que de alguma forma a pessoa nunca cresce. Nesse sentido, o carinho que existe entre pais e filhos se torna perigoso porque exige algo impossível: que a criança seja sempre criança. É perigoso porque cria uma ilusão que alimenta um estado de dependência que não é desejável no adulto.

    Lembrar da infância e celebrar o tempo passado com o que ele teve de bom, entendendo que ele terminou e deu lugar à novas fases que também trouxeram coisas boas é um caminho saudável para o desenvolvimento humano. Manter a ilusão de que “tudo voltará a ser como antes” é nutrir dependência e uma expectativa irrealista que nega o presente e o futuro como condições da vida assim como aquilo que pode vir de bom desses momentos temporais.

    Tornar-se um filho grande não tem a ver apenas com as características materiais como morar fora de casa e sustentar o seu estilo de vida. Envolve as questões emocionais de assumir-se adulto, em ver os pais como pessoas que estão envelhecendo e não são mais os pais de antigamente, lidar com possíveis culpas e medos em sair de casa e em organizar um novo papel de filho que não lhe permite mais ser dependente dos pais, mas, interdependente com eles.

     

    Comentários
    Compartilhe: