• 9 de dezembro de 2016

    O que é adequado?

    – Não sei se fiz certo ou não.

    – Também não sei, como você pode saber?

    – É né? Não tem esse negócio de certo ou errado, fiz o que achei que tinha que fazer.

    – Não é bem assim…

    – Mas como que eu posso saber?

    – Boa pergunta: que critérios você está usando para avaliar a sua ação?

    – Não sei… só fiz sabe?

    – Sim e é justamente por isso que não sabe avaliar… porém é importante você saber fazer isso.

     

    Falar em adequação hoje em dia pode ser muito perigoso. Porém, nunca vivemos um momento em que a reflexão sobre este termo e suas implicações se fez mais importante.

    Durante muitos anos a ideia de adequação estava ligada a uma questão social e moral. Quem determinava as regras de adequação eram as normas empregues pela sociedade, em geral, pela alta sociedade. Estes critérios não apenas diziam quem estava agindo de maneira adequada ou não como também avaliavam a pessoa moralmente a partir dos mesmos critérios. Se você não era adequado era, por extensão, uma pessoa perversa.

    Ao longo dos anos, as revoluções sociais buscaram romper com estes padrões de adequação impostos e desmoralizar toda e qualquer tentativa de elaborar novos padrões de comportamento, adequação e moralidade. A bandeira que foi erguida (e ainda permanece vistosa no alto do mastro) é a pergunta desafiadora: “quem pode ter certeza?”. No entanto, de maneira paradoxal, a bandeira que pretende defender nossa liberdade de expressão, pode colocá-la em risco.

    Ocorre que o grande problema das revoluções sociais foi de atacar a ideia de adequação sem compreendê-la de fato. É, sim, possível mostrar que algo é mais ou menos adequado dependendo dos critérios pelos quais avaliamos um determinado comportamento e um determinado contexto. O leitor mais crítico poderá dizer que a escolha dos critérios pode ser arbitrária. Concordo com o argumento, porém considerando que é viável entender se a escolha dos critério é arbitrária ou segue alguma lógica que seja útil.

    Ao avaliar um comportamento com um cliente, por exemplo, sempre faço referência à alguns critérios que considero úteis. O primeiro deles tem a ver com o contexto no qual a pessoa está, ou seja, onde o comportamento foi exibido. Gritar com alguém é algo que pode ser inadequado num primeiro encontro, porém adequado em um campo de futebol. O segundo são os objetivos da pessoa, no mesmo exemplo acima, se desejo nunca mais ver a pessoa com quem estou tendo um primeiro encontro, pode ser que gritar com ela violentamente seja um comportamento que pode me ajudar a atingir meus objetivos.

    O terceiro critério que emprego para avaliar tem a ver com uma perspectiva psicológica não facilmente acessível às pessoas. Analiso o comportamento da pessoa também com base em sua personalidade e questões neuróticas afim de determinar se a escolha que ela fez visa a saúde ou reforçar a neurose. Muitos comportamentos podem ser adequados ao contexto, mas não à saúde da pessoa.

    Estes três critérios são escolhidos para uma análise inicial do comportamento da pessoa. Eles não são os únicos, mas são aqueles pelo quais sempre começo. Dizer que um comportamento é adequado significa, em certa maneira, saber enquadrá-lo dentro da realidade. Você pode perguntar: qual realidade? É algo simples de responder se você observar o mundo tal como é e não tal como você gostaria que ele fosse.

    Nesse sentido é que a adequação começa a se tornar complicada (e polêmica). Um determinado comportamento pode ser adequado e inadequado ao mesmo tempo. Em geral as pessoas tendem a escolher um dos lados (geralmente o que favorece a sua percepção) e demonizar o outro. Minha perspectiva parte da compreensão de que não somos ilhas e, por este motivo, precisamos lidar com ambos os lados.

    Em outras palavras é importante conseguir lidar com a ambiguidade moral e psicológica em saber que o comportamento que tive pode ser adequado e inadequado ao mesmo tempo. Suportar este impasse é característica de maturidade emocional. A pessoa que consegue fazer isso é o tipo de pessoa que consegue, por exemplo, ter respeito por seu inimigo.

    Acredito na realidade, creio que quanto mais conseguimos perceber a realidade total de nossos atos, mais conseguimos ver se eles podem ser adequados ou inadequados e para o que ou quem o são. Conviver com a amplitude total do comportamento é sinal de maturidade porque mostra que a pessoa dá conta de algo além do seu próprio ego, considerando que todo comportamento pode gerar resultados positivos e negativos dependendo de quem esteja olhando e, nesse sentido, podemos, sim, efetuar avaliações.

    Abraço

    Comentários
    Compartilhe: