– Mas eu não sei… sinto preguiça de fazer isso.
– Claro.
– Claro? Porque claro?
– Porque você está falando sobre algo interessante, mas isso não significa que você está realmente dedicado à isso?
– Mas claro que estou, por isso não entendo essa preguiça.
– Se o compromisso fosse real, a preguiça não atrapalharia. Você começaria a fazer, mesmo com preguiça.
– Ah, mas daí é ruim né? Eu acho que a gente tem que estar feliz e motivado com o que vai fazer.
– Se isso acontece é ótimo, porém se isso não acontece, faz o que: desiste?
– É… é estranho…
– Sim, pois isso mostra que você espera um mundo perfeito, no qual você sempre acorda bem e disposto, ou seja, sem nenhum desafio ou problema para executar o que você se propõe.
– É bem isso que eu fico esperando mesmo.
– É melhor esperar sentado.
(risos)
Procrastinação, preguiça, “falta de vontade” podem ser sintomas de um outro evento: o apego ao ninho. Tornar-se adulto é mais do que ter uma quantidade de idade e um punhado de dinheiro no banco, significa sair de uma atitude de dependência para uma de autonomia. Porém esta mudança de atitude nem sempre é simples.
A atitude de dependência não é um problema. Todos nascemos assim e é possível estar dependente de alguém ou de alguma coisa ao longo de nossas vidas. A questão é que a atitude de autonomia também não tem nada de errado. Pelo contrário, a busca do organismo é em direção à autonomia. A atitude básica da vida é ir além. Nossa sociedade atual não possui rituais claros da passagem da infância para a vida adulta, assim sendo, não somos como os pássaros que são jogados do ninho quando estão maduros para voar.
Pelo contrário, inúmeros pais querem manter os filhos dentro do ninho: “mas porque vai gastar dinheiro com aluguel, aqui tem de tudo!”. Assim sendo, temos uma cultura que começa a enaltecer a dependência tornado-a uma virtude, tal como Neymar o (eterno) menino. O apego ao ninho, à infância e a imaturidade tornam-se, então, uma estrutura social. O apego ao ninho é uma atitude que visa manter o conforto, manter a dependência ao mesmo tempo que finge uma busca pela autonomia. Ora, uma pessoa não pode buscar as duas coisas ao mesmo tempo, então, engana-se.
O desejo pelo conforto do lar e pelas ilusões do comodismo fazem reflexo profundo na mente da pessoa. Sua forma de ver e pensar o mundo e si mesma neste mundo assumem esta característica de que tudo deve servir à pessoa. Esta é a sociedade de consumo: tudo está aqui para nos servir, não é? Bem, não, mas acreditamos que sim. Deixar a atitude infantil e dependente de lado não significa apenas ganhar dinheiro, significa compreender nosso lugar e tamanho no mundo.
A frase de Nathaniel Branden: “ninguém está vindo salvá-lo”, é muito importante neste quesito. A compreensão imatura crê que pai, mãe, sociedade, governo, alguém está aqui olhando por mim, porém perceber que nossa condição existencial é a solidão nos faz acordar e perceber que não estamos no ninho. Isso é diferente de não confiar em ninguém, ou crer que temos que fazer tudo sozinhos e sem apoio. Significa, antes, perceber que o papel ativo, diante daquilo que é importante para nós é fundamental se queremos nos tornar autônomos.
Essa condição reconhece o real e, por tal, entende que ninguém é só, nossa autonomia se faz junto com outras autonomias, assim sendo, nos relacionamos. Estas relações assumem um papel importante, não definidor, mas co-definidor de quem somos e do que fazemos. Assumir esta realidade também é parte do amadurecimento, sem isso, deixamos de lado uma enorme riqueza. O outro sendo o outro é algo importante de ser reconhecido, senão pensamos que este outro é apenas outra parte de mim e mergulhamos, novamente na dependência.