• 12 de junho de 2015

    Dia dos namorados?

     

    Dia dos namorados

    Não vou celebrar o dia dos namorados!

     

    Dar aos namorados um dia é dar valor aos namorados, ou seja, àqueles que namoram. Isto significa dizer que celebro o papel daqueles que namoram.

    Ao celebrar o título “namorado” em primeiro lugar excluo todos que não namoram – motivo de muitas dores no dia dos namorados – e em segundo dou crédito à ideia de que o título de namorado (a) é mais importante do que o namorar. Indo na contramão da contracultura, diria que o comércio está certo em dizer que você deve presentear no dia dos namorados, afinal é um reconhecimento à pessoa e ao título que ela carrega o que se está celebrando, assim sendo, porque não presentear? É como aqueles eventos em que damos um troféu para o melhor “alguma coisa” do ano. Damos um presente, um troféu para a pessoa por ser uma namorada (e, em muitos casos por aturar tanto tempo quem presenteia).

     

    Não vou celebrar isso, isso não me representa.

     

    Quem sabe, então, uma vertente mais abrangente do que o dia dos namorados pode ser?

    Quem sabe poderíamos celebrar o dia do “enamorar-se”?

     

    Quando falo do namorado, me refiro à pessoa, ao título. Quando falo do “enamorar-se” me refiro ao que acontece quando os olhos se encontram, quando a barriga esfria e a respiração prende. Quando nossa alma se percebe fisgada como que por uma magia por outra alma. Falo da experiência, falo do sentir, falo daquilo que é o que realmente nos faz, mais tarde, nos tornarmos namorados de alguém, noivos e conjugues.

    Não quero celebrar “alguém” ou o meu título com este alguém porque existe algo muito maior entre nós dois e foi isso o que nos fez e faz estarmos juntos. Não é que o outro não seja importante ou eu mesmo, mas que o título não faz sentido nenhum sem a experiência – acredito que quase todo mundo já passou pela insossa experiência de estar junto com alguém, mas sem estar enamorado desse alguém, o que é, simplesmente, um tédio, frente ao qual, preferimos a morte.

    A experiência é o que dá a base, é ela e a partir dela, que estruturamos relações e não sem ela. Mesmo nos casamentos arranjados existe uma grande preocupação com isso. Ninguém quer viver a vida ao lado de alguém sem nunca sentir paixão.

     

    Desta maneira, convido o leitor à fazer um exercício muito pouco comum. Entre em contato com o momento em que percebeu a paixão pela pessoa com quem você está hoje. Pode ter sido no cruzamento de um olhar, no meio de uma dança, entre um copo e outro de cerveja, numa sala de aula, no cinema, shopping, lembre-se. Lembre-se da sensação que você sentiu, aquela “coisa estranha”, que nos fere porque abre uma ferida que só pode ser preenchido pela mesma coisa que causa esta ferida, lembre-se do seu sorriso – aberto ou contido – da pulsação do seu coração. Lembre-se disso. Agora esqueça um pouco do seu parceiro e fique em contato com a sua emoção. Entre em contato com este enamorar-se. Perceba o tamanho e o poder desta energia. Sua vivacidade, o que ela causa em você – e nos outros.

     

    Pronto. Isto é o que eu acho que deveríamos celebrar. Esta energia. Este enamorar-se.

     

    É perfeito – para mim, pelo menos – porque é como se relacionar: é algo que é seu, mas não é só seu. É algo que te envolve e está envolvido por você ao mesmo tempo. É algo que acontece com a gente, mas só enquanto acontece fora da gente também. É algo que está no meio de um nós. É como aquilo que acontece quando as palmas das mãos se encontram: uma não se torna a outra, mas permanece envolvida pela outra. São uma e ao mesmo tempo são duas. E é isso que vale a pena no namorar. Sem isso o namoro vira tédio, sem isso a vida não segue. Sem isso sobrevivemos, mas com isso vivemos.

     

    Também vem com a vantagem de não excluir ninguém! Todos sentem o poder do enamorar-se. Não se trata mais de quem tem título e de quem não o tem, é uma celebração à energia que nos faz nos unir em torno de algo que é além de nós. Que por este motivo causa admiração pela força que possui e medo pela situação que nos coloca. Celebrar o dia dos namorados, para mim, é chinfrim. Celebrar a energia de enamorar-se não. E daí o interessante é que é meio estranho dar presentes à uma experiência. Se celebrarmos a experiência o que vamos fazer é buscá-la. Porque não buscar neste dia a experiência de apaixonar-se, de entregar-se à esse poder? Não, não falo de sexo (não apenas, claro). Falo daquele arrebatamento que sentimos. Creio que se isso fosse o mais importante, poderíamos até comprar coisas, mas como ferramentas, meios de chegar nesta emoção e não como um fim em si mesmo.

     

    Antes que você diga algo contra sabemos que as emoções podem sim ser evocadas. Na verdade, fazemos isso o tempo todo, só que não dominamos isso em nós. Ouvir uma música pode evocar muitas emoções, ir à um lugar  ou simplesmente recordar e imaginar uma determinada cena nos provoca emoções. Então, fica já a dica de como fazer.

    Isso me representa. Celebrar a emoção do enamorar-se, “sentir na pele esta emoção”, evocá-la e, então, poder usufruir dessa energia com uma pessoa, que dentre tantos bilhões de pessoas nessa terra tornou-se especial para nós por causa de um olhar, tarde de uma noite qualquer, numa rua qualquer da cidade, com um copo de uma bebida qualquer… que, no meio de tantos “qualquer” tornou-se “alguém que se quer”.

     

     

    Já não mais sou este coração,

    este olhar, este respirar.

    Já não sou mais estes planos,

    estas ideias, estes horizontes.

     

    Agora vivo numa interrogação.

    Dúvida contínua, insegurança perfeita.

    Consumo o meu tempo buscando

    Aquilo que mantém o meu tormento.

     

    Observar-te dormindo.

    Imaginar se dali um momento irá

    Sorrir, bocejar

    Ou me notar, convidando para um abraço.

     

    O futuro só isso pode oferecer:

    a dúvida de como vai ser.

    E tendo encontrado ele em nós

    Nunca mais desejo a certeza conhecer.

     

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