• 13 de maio de 2019

    Filhos responsáveis pelos pais

    – Você quer então que eu faça o que? Deixe eles assim?

    – Não quero nada, apenas olho para os fatos: você deseja ajudar seus pais na relação deles, não é?

    – Sim!

    – E já fez muito por isso, não?

    – Sim…

    – E o resultado?

    – Eles continuam fazendo o que querem.

    – E porque?

    – Porque eles escolhem isso?

    – Exato. Você já mostrou, já levou eles na terapia e se portou como pai deles, mas isso não funciona porque o problema é deles e não seu.

    – Isso é muito difícil para mim.

    – É verdade, é um tema difícil mesmo.

     

    É uma situação mais comum do que pensamos e mais sutil do que parece. As crianças tendem a assumir muitas responsabilidade que não são suas, afim de terem seu lugar na família. Embora a criança tenha pouco poder de escolha, ela ainda assim a faz. Entender isso como escolha é fundamental para que mudanças futuras possam ocorrer.

    É óbvio que a criança possui um pode de escolha limitado. A família é sua única perspectiva de mundo e ela precisa da família para sobreviver, assim sendo, como poderia dizer “não”? Embora seja praticamente impossível isso, a escolha da criança se faz por desejo de fazer parte da família, ela assume mesmo sem saber um papel e com ele segue. Este olhar possibilita ao adulto fazer novas escolhas. Rever o que lhe foi importante e decidir com olhos adultos e não mais com olhos de criança.

    Quando um filho se torna responsável pelos pais? Quando existe algo no adulto que ele próprio não dá conta. A criança é “sugada” por esta necessidade e se coloca na busca de resolver isso. Isto pode aparecer de forma muito clara, como uma criança que tem um genitor doente e cuida dele. Também aparece de forma sutil, uma pessoa que quer ser uma “boa pessoa”, achando que com isso, agradará aos pais e ele precisa fazer isso porque sente neles uma necessidade de aprovação, ou seja, os pais tem esta necessidade e a criança assume para si, mesmo sem ter consciência plena disso.

    As crianças “fazem pelos” pais. Assim sendo ela se tornam vinculadas ao destino dos pais. Ou seja, a criança não olha para si afim de buscar a felicidade, ela olha para os pais. Ela se pergunta: meus pais estão felizes? E isso toma a pessoa como um todo. Ela se anula diante das necessidades dos pais. Alguns, no entanto, tem um forte desejo pela vida e acabam vivendo vidas partidas. De um lado querem resolver a vida dos pais e de outro lado querem viver suas próprias vidas.

    Aprender a deixar esta responsabilidade de lado significa, na verdade, aprender qual o seu lugar de fato. Porém isso é sempre difícil, pois significa, também aceitar que algo falta nos pais. Aceitar que os pais tem problemas e deixá-los com estes problemas. A criança acredita que pode resolver os problemas dos pais, 40 ou 50 anos mais tarde, ela não conseguiu, mas mantém a meta. Perceber que isso é uma ilusão de poder e não um poder de fato é o que faz a pessoa se colocar no seu lugar: de filho ou filha.

    Aceitar aquilo que podemos chamar de “destino” dos pais é uma tarefa difícil, pois significa “render-se” à realidade: os pais poderão mudar, mas isso depende deles. É comum as pessoas acharem que estão abandonando os pais, quando tem esta dinâmica de se sentirem responsáveis por eles. E é algo difícil também por forçar a pessoa a se reorganizar em relação à quem ela é na família. Achar o seu lugar apenas como filho não é sempre fácil, assumir a sua própria vida também não.

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