• 6 de outubro de 2017

    O outro lado do mandão

    – Eu fiquei surpresa com ele.

    – Porque?

    – Bem, eu falei com ele. Fui séria, mas não arredia. E ele ficou ali me ouvindo e no final disse: ok.

    – Disse e fez?

    – Sim.

    – O que te surpreendeu?

    – Ele é tão mandão, nunca pensei que ele pudesse falar “ok” e ir fazendo.

    – A questão sempre foi o seu medo da atitude mandona dele.

    – É… é verdade.

     

    O mundo está cheio de pessoas mandonas. Em geral, as respostas oscilam entre medo e desdém em relação à elas. Porém, existe um consenso entre as pessoas que convivem com mandões: em geral são sempre extremados, 8 ou 80. Essa característica oculta o medo que essas pessoas tem do mundo, um dos motivos pelos quais se tornam mandões.

    Existe uma diferença entre mandar e pedir. Quando pedimos, estamos dispostos a aceitar “não” como resposta, afinal de contas, foi um pedido e o outro pode dizer isso. Ao mandar, “não” é uma resposta que não é possível. Pessoas “mandonas”, como o nome já diz agem dessa maneira. Elas podem até dizer “por favor”, porém se trata de mera retórica, elas “sabem” que o outro tem que fazer e fazê-lo de determinada maneira. Em situações organizacionais e de pressão é até desejável que as pessoas que detém conhecimento ajam assim, afim de organizar tudo o mais rápido e eficientemente possível.

    Porém, na vida de casa, amigos, balada, filmes, família, muitos querem ser assim também. Querem mandar em todo mundo, organizar seus arredores. São aquelas pessoas que tendem a sofrer da “síndrome do pequeno poder”, ou seja, acreditam-se destinadas a organizar o entorno do lugar onde vivem, a vida das pessoas, seus afetos e afazeres. Embora bem intencionadas, na maior parte das vezes, trocam os pés pelas mãos e colecionam momentos de rancor e desaprovação. A pior parte é: não entendem o porque disso.

    “Afinal, se você agisse certo, eu deixaria você fazer o que quer”. Toda pessoa que já conviveu com um mandão sabe que isso é mentira. Se você fizer exatamente o que um mandão quer, ele arranja outra coisa para você se ocupar. Este é, inclusive, o motivo pelo qual o mandão assume este jeito de agir. Ele tende a criar sempre um cenário de insatisfação com o outro afim de que essa pessoa fique perto. Sim, pode parecer contraditório, mas o desejo final é a proximidade e não a distância.

    O mandão tem um problema sério em dizer: eu preciso de você. Ao invés de fazer isso, ele começa a criticar a outra pessoa e encontrar defeitos em suas atitudes. A ideia é organizar o mundo e a vida do outro para que o próprio mandão sinta-se melhor. Ele tem medo de um mundo que não compreende e que não pode controlar, ao mesmo tempo, deseja as pessoas perto dele. Tornar-se crítico e mandão é a maneira pela qual ele cria uma forma de conseguir aquilo que quer.

    O problema é que essa atitude, termina por criar distância. Mesmo que o outro se submeta aos seus caprichos, estará sempre distante emocionalmente, pois sabe que no fundo, não é adequado o suficiente para estar com seu “mandão favorito”. Esta dinâmica cria distância porque um se torna muito grande e o outro muito pequeno, assim sendo não há como manter uma relação próxima. Apenas no esquema pia-filhos ou professor-aluno é que este tipo de dinâmica tem eficiência no começo. Mas com humanos de “mesmo nível”, não.

    Abraço

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