• 15 de novembro de 2021

    Síndrome de cafajeste (ou “isso é coisa de homem né?”)

    – Ah doutor, mas é muito difícil… você é homem, você sabe.

    – Sei do que?

    – Que a gente tem que satisfazer os desejos.

    – Claro, mas o que isso tem a ver com traição?

    – Ah, tem outras mulheres não tem?

    – Tem. Mas e o meu desejo em ter somente uma não conta?

    – Mas e quem disse que eu tenho esse desejo?

    – Você, ao escolher ficar com uma.

     

    Muitos homens são presos, vítimas de uma ideia de que homem precisa sair “espalhando seus genes pelo mundo”. Não é apenas falsa esta noção como também cria a desculpa ideal para que muitos homens nunca entrem em contato com suas emoções e a dificuldade que sentem em expressá-las. A dor da solidão, mascarada de liberdade é o destino desses homens.

    Em primeiro lugar, vamos deixar claro algo: as pesquisas mais recentes mostram que o cérebro humano tem a capacidade de ser feliz tanto em uma relação monogâmica quanto em uma poligâmica. Não é o “destino da natureza” sermos todos necessariamente poligâmicos para sermos felizes. Este esclarecimento é necessário porque muitos homens tem a crença de que eles precisam ter várias mulheres. Em segundo lugar: sexo com profissionais do sexo também é considerado traição. Este esclarecimento é importante porque muitos homens acham que sexo com profissionais não é traição, porém isso só é verdadeiro se for de comum acordo – o que quase nunca é.

    Homens com a “síndrome de cafajeste” tem como marca várias distorções do pensamento que asseguram à eles algo que é confundido com liberdade: solidão. Mas porque alguém deseja a solidão? É comum à esses homens a sensação de liberdade ao chegar em casa e ter a casa vazia. Sentem-se felizes porque não vai ter “ninguém para encher o saco”. Essa sensação é, na verdade, um afastamento das demandas emocionais. Em geral, acham “um saco” ter que dizer “eu te amo”, ficar agarradinho com a mulher ou fazer carinho. Sentimentos ternos e calmos causam muita ansiedade neles e por este motivo desejam “liberdade”. Porém esta liberdade é, na verdade, o desejo por solidão.

    Porque não é apenas com a mulher atual que eles sentem a “encheção de saco”, é com qualquer uma. Em geral, as relações demoram de 6 meses a um ano para se tornarem chatas e elas começarem “com coisas de mulher”. O fato é que esses homens não sabem ser ternos – nem com eles mesmos – e, por isso, terminam buscando a solidão. A ternura é confundida com fraqueza e a solidão com liberdade. A poligamia é confundida com força e com a sua “verdadeira natureza”, algo que “não dá para controlar”. Porém, porque não dá?

    Porque é uma forma de dependência. O ciclo funciona assim: ao estar em uma relação afetiva por mais tempo, ele percebe o desejo de ternura – dele e da mulher – porém não sabe como lidar com isso, entendendo que ternura é igual fraqueza (aqui entra o medo inconsciente de ser dominado). Com isso em mente se sente preso, é requisitado pela mulher à falar de seus sentimentos (o que ele entende como “cobrança”), mas fecha-se mais ainda o que aumenta a sensação de “prisão”. Por fim, sente a necessidade de “liberdade”, “fazer o que quer”. É aí que as outras mulheres entram e por este motivo que é “incontrolável”. É porque o homem quer “despressurizar” e não porque essa é a sua “natureza”.

    O ponto fundamental, então, reside em aprender a ter sentimentos ternos. A falta desse aprendizado é o que realmente aprisiona o homem e não a sua relação – afinal, ele é livre para ficar ou ir embora, não é mesmo? Enquanto ele não aprende a sentir e identificar isso como sinal de força, precisa manter-se apegado à luta, trabalho e sexo fora do casamento como maneiras de se provar homem. Ora, quem precisa “provar” é porque não é ainda. O homem de verdade pode ser terno quando quer e quando isso é bom para ele. Assim, não há o sentimento de ser prisioneiro das “coisas de mulher” e sim a liberdade de sentir e expressar as “coisas de humano”.

    Abraço

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